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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

PL 1754/2011 – Extensão do Porte de Arma aos Advogados.

Christian Mirkos Santos Pereira, OAB/SC nº 12.238[1]
“Em face de agressão injusta, a vítima tem a faculdade legal e o dever moral de obstá-la, mesmo recorrendo ao exercício de violência”[2].
Palavras-chave: Artigo. PL 1754/2011. Projeto de Lei da Câmara. Estatuto da OAB. Legislação Infraconstitucional. Crítica. Fundamento constitucional. Isonomia. Direito.
O PL 1754/2011[3] recebeu a seguinte ementa: “Altera, inclui e revoga dispositivos na Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994; revoga dispositivo da Lei nº 9.527, de 10 de dezembro de 1997; e dá outras providências”. Explicação da ementa: Autoriza que os advogados portem arma de fogo para defesa pessoal e regulamenta os direitos dos advogados públicos”.
Atualmente, o porte de arma é vedado, com exceções insculpidas no art. , da Lei nº10.826/03[4], deu-se especial atenção às pessoas e órgãos ligados à Segurança Pública (art. 144, da Constituição da República).
A autorização legal para porte de arma de fogo, exceção à regra, sujeita os cidadãos à discricionariedade da Autoridade Policial Federal, justamente a pessoa com quem os advogados costumam travar os mais aguerridos embates na defesa dos direitos inerentes à cidadania. Assim, ingenuidade imaginar que a discricionariedade não se comute em arbítrio. E, quando tal direito é negado pelo Departamento de Polícia Federal, o entendimento dos tribunais federais não tem sido diverso[5].

Fundamento Constitucional

O art. , “caput”, da Constituição da Republica Federativa do Brasil, diz que “todos são iguais perante a lei [...]”. A seu turno, o art. 133, da CF/88, alinhando-se à garantia fundamental retro, dispõe: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”[6].
Dizer que o Advogado é inviolável no exercício da profissão enquanto se lhe tolhem direitos e prerrogativas que deveriam garantir-lhe esta inviolabilidade é um nonsense.
O conceito operacional de inviolabilidade comporta interpretação extensiva admitindo a salvaguarda da dignidade profissional e a liberdade física do advogado, indispensável que é à administração da justiça em todas as áreas de jurisdição.
A advocacia se aperfeiçoa mediante a atuação livre, consciente e direta do titular da capacidade postulatória, o advogado (art. 36, do CPC e art. I, da Lei n. 8.906/94). É aqui que constatamos a valiosa contribuição e aperfeiçoamento trazido pelo PL 1754/2011, uma ferramenta garantidora da pessoa do advogado, pondo-o em igualdade de condições aos juízes e promotores de justiça.
Os índices de violência urbana[7] não dão espaço a visões românticas acerca do entendimento esposado de que o direito ao porte de arma pelo advogado opera em favor do jurisdicionado (cidadão). Sendo útil perquirir as condições reais de tempo, lugar e modo em que o exercício da advocacia e, portanto, do direito a ampla defesa, se desenrola. O advogado vai até o cliente; o juiz e o promotor não vão e, via de regra, nos fóruns há segurança privada e/ou estatal.
Cumpre observar que o direito ao porte de arma defendido pelo PL 1754/2011 não configura privilégio. No âmbito forense, Promotores de Justiça (art. 42, da LEI Nº8.625, de 12/02/1993 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e Magistrados (art. 33V, da Lei Complementar nº 35, de 14/03/1979) já o detém.
Logo, a extensão do direito de portar armas de fogo aos advogados se sustenta pelos mesmos fundamentos etiológicos. Afinal, não há hierarquia nem subordinação entre os mencionados operadores do direito (art. , “caput”, da Lei nº 8.906/94).
Por aplicação direta do princípio constitucional do tratamento isonômico (art. I, daConstituição da República), em consonância com o respeito ao advogado e seu múnus público e à indispensabilidade daquele à administração da justiça; ao que devemos somar a ausência de hierarquia e subordinação entre os operadores do direito é que defendemos a constitucionalidade do PL nº 1754/2011 e, por conseguinte, a perfeita harmonização deste ao ordenamento jurídico infraconstitucional.

[1] Bacharel em direito pela Universidade do Vale do Itajaí e autor do livro “Um Pai Criminalista”, da Ed. CEITEC; militante da advocacia criminal.
[2] TJSP, RT 624/303; TACrSP, Julgados 75/406.
[3] Autoria do Deputado Federal, por Santa Catarina, Dr. Ronaldo Benedet.
[4] Atentar ao disposto no inciso XI, do art. 6º, do SINARM.
[5] ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA - PORTE DE ARMA DE FOGO - CONCESSÃO/RENOVAÇÃO DE PORTE DE ARMA DE FOGO - NEGATIVA PELA ADMINISTRAÇÃO - ADVOGADO - ALEGAÇÃO DE ATIVIDADE DE RISCO - DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. 1 - O porte de arma deve ser deferido somente àqueles que exercem atividade profissional de risco ou estejam com sua integridade física comprovadamente ameaçada. 2 - A atividade da advocacia não pode ser classificada como atividade profissional de risco. 3 - O deferimento do porte de arma de fogo constitui-se medida excepcional e discricionária e não restou demonstrado nos autos o risco da atividade desempenhada pelo apelante. 4 - A Lei do Desarmamento tem o intuito de realmente desarmar a população, tornando raras as exceções em que se concede o porte de arma. 5 - Recurso desprovido. Sentença mantida. (TRF-2 - AC: 200951010151723 RJ 2009.51.01.015172-3, Relator: Desembargador Federal FREDERICO GUEIROS, Data de Julgamento: 20/06/2011, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: E-DJF2R - Data:28/06/2011 - Página:155 - GRIFEI).
[6] A expressão “indispensável” consignada no cânon constitucional é, a meu ver, mera retórica e recomendo a leitura do seguinte trecho extraído da ADI nº 1127: “[...]Sua presença, contudo, pode ser dispensada em certos atos jurisdicionais” (ADI 1127, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator (a) p/ Acórdão: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/05/2006 – GRIFEI). Até uns dias atrás, a tribuna reservada aos Advogados no plenário do STF situava-se em patamar inferior a dos Ministros (fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=275936; acesso em 29/10/2014).
[7] “A taxa média de homicídios global é de 6,2 por 100 mil habitantes. [...] América do Sul, África Central e o Caribe (entre 16 e 23 homicídios por 100 mil habitantes)”.Fonte: UNODOC – United Nations Office on Drugs and Crime – Global Study on Homicide 2013.

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